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Biblioteca de Fanzines

sexta-feira, 22 de abril de 2016

-Crítica- Os Negros

-Crítica-

(Eu nasci em 1985, parda, filha de pardos, que são filhos de pardos e negros, que são filhos negros, filhos negros, filhos da África onde tudo começou...)

Os Negros

Outro dia estive pensando calculadamente, nas raízes e origens do nosso país.
Fiz um resgate gigante de memórias usando exemplos do que aprendi nas aulas de história,
do que aprendi lendo livros e do que aprendi vendo a vida, resolvi escrever esta crítica.
Programei meu cérebro para ser justo durante o desenvolvimento do texto.
Afinal dentro de mim tem sangue negro...

Ainda no ensino fundamental lá nas aulas de história, eu aprendi que os negros vieram da África.
Erroneamente os professores daquela época não estavam preparados para dizerem a verdade para nós pequeninos.
Ou talvez eles não tivessem mesmo o conhecimento correto sobre o tema envolvido.
Hoje sei que eles não eram escravos, eles eram escravizados.
A expressão nasceu escravo não deveria existir em sala de aula.
Naquela mesma época, aprendi que não vieram por livre vontade.
Eles vieram amarrados em condições desumanas, jogados no fundo dos navios sem esperanças, eles cruzavam os oceanos. Nos tais navios negreiros, assim chamados.
E aprendi que eles morriam de fome, de calor e atacados por doenças.
E aprendi que aqueles que morriam eram jogados ao mar.
Sinceramente não sei se morrer era um castigo, um motivo de tristeza ou alívio para eles.
Fui crescendo e aprendendo que eles; os negros, homens e mulheres eram escravizados, e eles já nasciam com este destino só por causa da cor de sua pele.
E eles eram vendidos como mercadorias e eram açoitados, você sabe o que é açoitado?

-Pesquise-

E na medida em que eu fui crescendo e passando de série na escola, eu fui aprendendo mais e mais sobre o povo negro principalmente nas aulas de história.
Os professores não conseguiam responder a todos as minhas perguntas.
Eu perguntava muitas coisas complexas, por que em meu coração eu não conseguia aceitar
aquela verdade tão cruel!
Então eu comecei a pesquisar um pouco mais sozinha em busca de respostas. Isso é claro, de acordo com minha maturidade na época.
Aprendi sentindo um gosto amargo no saber, como eles sofreram, como eles viveram.
Descobri que os negros ainda que escravizados, não desistiam do sonho de liberdade.
Eles inventaram uma dança que escondia uma luta para se defenderem dos capatazes e dos capitães do mato, era a tal (Capoeira).
Aprendi sobre seus conhecimentos medicinais das ervas, sobre suas crenças, ainda que escravizados eles não perdiam a fé, tanto que suas crenças culturais permanecem até hoje, (Candomblé e Umbanda).
 Aprendi sobre suas comidas. A que comida que lhes era permitido comer. E eles foram astutos também nisso. Pesquise que comidas eles comiam, e como foram espertos para adaptar suas receitas nativas, garanto que você comeu e come comidas que se originaram por meio das mãos deles.

na medida em que eu fui crescendo, eu fui descobrindo e imaginado a dor de ser um negro naquela época, sem entender direito por que uma pessoa era tratada assim, só por causa da cor da pele eu fui crescendo.
E quanto mais eu aprendia, mais eu sentia tristeza e orgulho! Vontade de aprender mais.
E sinceramente eu aprendi. Aprendi estudando sozinha, nas aulas de história ou no dia a dia que mesmo as pessoas são muito menos do que deveriam ser. Menos humanas e menos humanizadas. Menos amáveis e menos amadas.
E eu me surpreendo toda vez que me deparo com situações que denigrem a imagem do negro.

A história deste país é banhada de dor, o sangue dos NEGROS e NEGRAS, ainda choram nas veias de quem é descendente.
E isso é triste!
Quem é negro sabe bem a que dor me refiro.
Sabe aquela dor na alma, no sangue, a dor da servidão.
Não se consegue ser patriota num país onde o passado é cheio de dores, sangue e mortes, política e religião andaram lado a lado, escravizando pessoas.
E isso eu aprendi também em aulas de história.
Ainda hoje o povo negro sofre por ser negro...

Com o tempo eu tive tanto interesse em relação aos assuntos que diziam a respeito deles,
que me dediquei a buscar mais afundo a intensidade do assunto.
Quis conhecer mais, saber mais, entender mais.
E assim o fiz por um longo tempo, na verdade, ainda o faço.
O que descobri nos livros, nas pesquisas era um pouco pior do que as coisas que eu aprendi nas aulas de história do ensino fundamental e médio.
Aprendi como eram vendidos, como eram utilizados em escambo, como eram avaliados,
como eram tratados divulgados em jornais feito objetos mesmo.
Ainda que eu estude a vida inteira, não saberei de fato como foi ter vivido no tempo deles.
No tempo dos escravizados, mesmo assim estudar meu deu uma idéia mínima de como foi.
De como viviam...
E isso ainda me entristece!

Não é de se espantar que tenham inventado a capoeira, nem que tenham se rebelado, formando quilombos. Que tenha escolhido um líder para se espelharem em esperança de liberdade. Eles sentiam a dor de ter uma pele. Uma pele com uma sentença.
-Escravidão!
Esta era a sentença de ser negro.

(Escravo/ Escravizado/Escravidão) – Pesquise.

Talvez você não saiba dessa herança que tem, eu vou te contar uma coisa muito verdadeira e séria, já que você leu até aqui. Dentro de você existe sangue e DNA do povo negro.
Nos seus genes, sangue e DNA foi já foi sentenciado, mesmo que sua pele seja branca, albina, laranja, roxa, azul seu sangue é negro.
Mesmo que você seja rico, pobre, gari ou juiz de direito eu tenho uma verdade para você. Você carrega genes de um povo negro.
É isso mesmo, você é filho deste país que derramou o sangue dos seus antepassados, que no chão ainda chora.


‘’ Você Luta capoeira, capoeira é a luta dos negros, com dança.
Você segue o Candomblé, a Umbanda, ou faz simpatias e toma chás, isso é herança dos negros.
Você toca tambor, dança um samba, trança os cabelos isso é herança dos negros.
 Você come um monte de comidas e usa um monte de temperos que você não sabe, mas são heranças dos negros.
E você faz artesanato, ou gosta de usar, e você acende velas para Deus e ao mesmo tempo tem medo do Diabo, isso é herança dos negros.
Você que gosta de imagens, que gosta de conchas e usa turbantes nos cabelos, isso é herança dos negros.
Você que trabalha duro e reclama o salário, isso é seu sangue gritando, por você vive a herança de ser negro. De ter um negro nas veias. ’’

Todas essas coisas que estou escrevendo agora, são coisas que aprendi em pesquisas,
anos de pesquisas. Livros, revistas, jornais, inclusive se você pesquisar anúncios de jornais publicitários antigos, você vai ver que eles, os nossos pais de sangue eram vendidos como mercadorias, em anúncios de jornais.
Não há como não entristecer...

Por fim, pela jornada da vida aprendi e tenho aprendido cada vez mais, que a escravidão ainda existe para este povo, no qual pertenço por bem querer pertencer.
*Desigualdade salarial entre brancos e negros ainda existe.
*Piadas de negros existem aos montes.
*As piores comparações de cheio, higiene são feitas a negros.
Entre estas coisas tantas outras que eu poderia citar a ponto de formar um livro.
E eu poderia citar mais, mais, e mais exemplos de preconceito, de desigualdade racial, em relação a este povo maravilhoso, quem alguém um dia teve a péssima ideia de tornar escravo da própria cor.
Fizeram deste povo um povo marcado pela escravidão de sua condição humana de nascer e nascer negro.

E eu fico sensibilizada e indignada, por que não bastasse o passado, e as mentiras que contam para as crianças nas escolas, ainda hoje existe um governo que não luta pelo direito deste povo, que ainda vive que ainda sofre nas margens da sociedade.
Todo mundo sabe que preconceito racial é crime.
Mas eu deixo estas perguntas:
- Quantas condenações você já viu, por discriminação racial?
- Quantas pessoas você já viu sofrendo preconceito?

Quando participei do provão nacional ENEM, na minha turma tinha apenas uma negra.
Na sala inteira, apenas uma negra. E eu sei que isso se deu por conta da margem social em que os negros se encontram até os dias de hoje.
Quando acompanhei uma amiga até um feirão de negociação de final de ano SPC/ SERASA,
não me surpreendi com o que vi, numa multidão de mais ou menos três mil pessoas, podia se contar os brancos entre os negros.
E eu também sei o porquê disso, por que negros estão afundados em SPC SERASA? Por que eles estão na margem da sociedade até os dias de hoje.
É impossível não lamentar estes fatos...

Este país não é livre de verdade!
Eu em particular não conheci até hoje  nenhum brasileiro patriota, daqueles que morreriam pela bandeira brasileira ou pelo país.
Só vejo brasileiros usando roupas e acessórios verdade e amarelo durante as copas.
E isso não é ter amor a pátria.
Se eu os condeno?
Não!
Não os condeno, por isso vem de um povo com sangue sofrido nas veias.
Um povo que sofre por melhorias.
Viver com um salário mínimo, viver sem ter sequer a dignidade de um atendimento de saúde, isso não é ser livre.
Ainda somos como aqueles negros escravizados.
Sinceramente, acredito que poucos dos amigos que tenho irão me dar à honra de ler esta crítica.
Mas eu vou escrever mesmo assim.
Eu estou a escrevendo.
Isso por que me sinto no dever para com a verdade sobre este tema.
Isso por que acredito em cada palavra deste texto, por que se uma pessoa ler esta crítica ainda que não concorde, eu sentirei paz.
Paz e sensação de dever cumprido, por que escrever sobre o povo negro está sendo uma questão de honra para mim.

Mostrar o que muita gente não vê ou não sabe.
E dizer que leu isso aqui, muito obrigada!
E tenha orgulho de carregar um sangue tão forte.
Não deixe de acreditar no amanhã melhor.
Eles morreram acreditando nisso.
E deixaram esta cultura maravilhosa que vivemos e nem conhecemos de onde vem.

Aqui na despedida do que considero importante deixar escrito, com os olhos marejados, escreve uma menina de pele parda, que cresceu numa família cercada de brancos de olhos verdes e um Avô Negro, o ser humano responsável por todas as sementes boas que levo no coração.
Então sempre que eu me pergunto quem eu sou, e qual a minha origem, eu sei a resposta, sou negra, filha de negros.
E não só este, mas todos os povos merecem ser respeitados.

Por: Daniela Dias.